PUBLICAÇÕES
Artigos autoriais e notícias sobre Direito de Família, Sucessões e Mediação Familiar.
Artigos autoriais e notícias sobre Direito de Família, Sucessões e Mediação Familiar.
Ao ler ou ouvir o nome Aline Campos talvez você não consiga, de imediato, associá-lo à pessoa sem antes dar aquela pesquisada no Google. Mas com certeza você já viu a modelo e atriz em programas de TV como o extinto “Domingão do Faustão” (ela foi dançarina da atração por muitos anos) e também como garota-propaganda de uma grande cervejaria. É que Aline, até bem pouco tempo, usava o sobrenome Riscado, que vinha de seu ex-marido, Rodrigo Riscado, de quem ela se separou em 2015, após sete anos de união. Mesmo após o fim do relacionamento, a modelo e atriz manteve o sobrenome de casada como nome artístico, até que, no mês passado, anunciou o que ela definiu como uma volta às origens. “Meu nome de batismo volta a ser minha força, a forma que quero ser chamada daqui pra frente!!! Prazer, sou Aline Campos, de volta às minhas raízes em todos os sentidos!”, disse ela nas redes sociais.
Não é de hoje que as mulheres incorporam o nome da família do marido com o casamento. Durante um período, era condição obrigatória em muitos países para oficializar a união e, mesmo após se tornar uma opção, garantida pela lei (como é o caso do Brasil), ainda é muito comum ver mulheres adotando o nome de casada. A atriz Viviane Araújo, por exemplo, oficializou a união com o empresário Guilherme Militão, e, após a cerimônia, contou que adicionou o sobrenome do marido à própria assinatura. Em meio aos debates e lutas pela igualdade de gênero que acontecem pelo mundo, isso tem levantado alguns questionamentos: por que muitas mulheres, ainda hoje, optam por mudar o sobrenome ao casar? Isso é uma tradição inofensiva ou machismo?
“A adoção do sobrenome do marido pela mulher é, antes de mais nada, uma tradição cultural em grande parte do ocidente. E como toda tradição cultural, as pessoas inseridas em determinada cultura vão fazendo coisas de certa forma inconsciente, seguindo as tradições que lhe foram passadas por seus antepassados”, pontua a advogada Mara Lúcia Nunes, especialista em Direito da Família.
Entretanto, com o passar dos anos, essa tradição foi ganhando novos contornos. No Brasil, por exemplo, o Código Civil de 1916 tratava sobre a questão. “Esse Código Civil, que ficou em vigência até 11 de janeiro de 2003, colocava o homem como o chefe da família. O Código tinha um capítulo sobre os direitos e os deveres da mulher, e uma das obrigações era assumir o sobrenome do marido”, explica o advogado Conrado Paulino da Rosa, pós-doutor em Direito, em São Paulo.
“Em 1962 tivemos o advento do Estatuto da Mulher Casada (Lei 4.121), que foi considerado como um importante instrumento de emancipação feminina, visto que teve o condão de alterar mais de dez artigos do Código Civil vigente, mas ainda assim a adoção do sobrenome do marido pela mulher continuou obrigatório”, comenta Mara Lúcia. “Porque até 1962 a mulher casada era relativamente incapaz. Tanto que era muito comum que as mulheres nem tivessem CPF; quem fazia os negócios da família era o marido, que tinha que autorizar a esposa a trabalhar ou não”, completa Conrado. Foi só com a Lei do Divórcio, criada em 1977, que adotar o sobrenome do marido passou a ser uma opção, e não mais uma obrigação.
• Além de uma simples tradição:
Ativista dos direitos humanos e integrante do coletivo feminista 8 de Março Unificado - RMBH, Irlene Dias Oliveira, 56, defende que a questão de a mulher adotar o sobrenome do marido vai muito além de uma simples tradição passada de geração em geração. “Isso é assunto muito complexo para nós (mulheres), e eu nem falo como militante feminista, mas como mulher. Quando me casei, há 36 anos, me falaram que era obrigatório eu usar o sobrenome do meu marido. Eu me casei muito nova, com 20 anos. Naquela época eu era muito imatura, e acreditei naquilo. Mas já não era obrigatório, e eu só fui descobrir isso alguns anos depois”, relata Irlene, que tentou reverter a situação, mas desistiu da ideia devido ao alto custo financeiro, que envolve, inclusive, valores para a emissão de novas vias de documentos. “Se fosse hoje eu não mudaria meu nome ao casar”, afirma.
A coordenadora administrativa financeira Renata Bragança, 32, conta que quando se casou pela primeira vez, há 10 anos, foi muito influenciada pelos pais e, por isso, acabou adotando o sobrenome do marido. “Meu pai é muito machista. Na cabeça dele, a mulher tinha que pegar o sobrenome do marido, para ser uma senhora na sociedade casada. E na época eu me deixei levar por isso, porque eu era muito jovem, tinha 22 anos”, conta ela, que se separou dois anos depois. “Hoje eu não me deixaria me levar assim, porque essa é uma decisão muito pessoal”, pondera.
Segundo Irlene, ainda hoje há muitas mulheres que preferem abandonar o nome de solteira ao se casar por desconhecimento das leis. “Tem muita mulher que acredita que se não colocar o sobrenome do marido ela pode se prejudicar no futuro, com a questão da herança, por exemplo. E também por acreditar que pode não conseguir respeitabilidade por, mesmo estando casada, usar o nome de solteira”, cita. “Ainda existe muita discriminação em torno da mulher solteira, sozinha e divorciada. Muita gente pode pensar que ela foi largada, mas nunca se pensa que foi ela quem pode ter largado o homem. E tem mulheres que não se sentem bem diante dessas situações”, acrescenta a ativista.
“Na hora do casamento, isso passa na cabeça de muitas mulheres, que pensam nesse status completo do casamento, para todo mundo saber, e isso vem através do nome, principalmente. Nossa cultura ainda está muito condicionada a esse status”, pontua Irlene. “Ainda hoje é considerado um desvio social a mulher ser solteira, uma mulher ser separada. Ter só o nome do pai e da mãe é algo torturante para muitas mulheres de meia idade, por exemplo. Porque ela é rotulada de ‘solteirona’, ‘encalhada’, ‘não conseguiu encontrar ninguém’, mesmo que a opção dela tenha sido ser solteira e estar sozinha, sem um companheiro ou companheira”, completa
• O que muda perante a lei?
O Código Civil Brasileiro, que entrou em vigor em 2003, também concede ao marido o direito de adotar o sobrenome da mulher. “Embora essa prática pelo homem seja muito pouca adotada até os dias de hoje”, diz a advogada Mara Lúcia Nunes. Segundo ela, do ponto de vista da lei, alterar o nome por causa do casamento não tem qualquer tipo de consequência ou benefício especial.
“Legalmente é importante frisar que ao casar e adotar o nome do marido, a mulher precisa alterar todos os documentos e passará a ser reconhecida pela designação familiar do casal. Caso separe e decida retornar ao nome de solteira, terá que fazer o caminho inverso”, pontua.
Essa é uma situação que a coordenadora administrativa financeira Renata Bragança passou uma vez e que não pretende repetir. “Para mim, a maior dificuldade foi em relação ao FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). Então, quando muda o nome, e até atualizar nos bancos… eu fiquei, por exemplo, com atraso para receber o seguro-desemprego, tinha que atualizar a carteira de trabalho, mas deu um erro na hora de atualizar o FGTS. Eu tive que ficar meses correndo atrás até resolver essa situação”, explica Renata.
• Nome de casado pode ser mantido após a separação:
Há casos em que, mesmo após a separação, tanto a mulher quanto o homem podem manter o nome de casado, a exemplo da atriz e modelo Aline Campos, que continuava a assinar o sobrenome do ex-marido Rodrigo Riscado. “É um direito personalíssimo, porque a pessoa pode até ter até mesmo uma identificação profissional a respeito disso. A Marta Suplicy, por exemplo, já se divorciou do Eduardo Suplicy, já casou de novo e já se divorciou, e ninguém a conhece pelo sobrenome de solteira”, comenta o advogado Conrado Paulino da Rosa, pós-doutor em direito, e professor do MeuCurso, em São Paulo.
“Na própria ação de divórcio, a pessoa manifesta seu interesse em não mais usar o nome de casada e na própria sentença de divórcio o juiz manifesta a autorização para que ela ou ele retorne ao nome de solteira ou solteiro”, explica a advogada Mara Lúcia Nunes. “Porém, há casos em que a mulher quer manter o nome de casada e o marido não quer e, assim, caberá discussão. O mesmo procede para os casos em que o marido adota o sobrenome da esposa”, completa a especialista em direito da família.
E é essa discussão na Justiça que a coordenadora administrativa financeira Renata Bragança tem tido com o ex-marido desde que eles se separaram. Segundo ela, no casamento, ela adotou o sobrenome dele, e ele, o dela. Com o divórcio assinado, conta Renata, ficou estabelecido que ambos deveriam voltar a usar o sobrenome de solteiro. Ela cumpriu a decisão, entretanto, o ex-marido dela não. “Mesmo quase 10 anos (do divórcio), ele continua a usar meu nome”, afirma ela, que revela que pretende abrir um novo processo para resolver a situação.
Um abraço para todos.
Drª. Larissa Reis (OAB/SP Nº. 359.225) e Drª. Mara Lúcia Nunes (OAB/SP Nº. 173.973).
Fonte: Jornal O Tempo. "Por que a mulher ainda muda o nome ao casar?" Publicação autorizada.
Entre em contato e diga-me de que forma poderei lhe auxiliar.
Será um prazer atendê-lo (a) para sanar suas dúvidas, receber seus comentários ou sugestões. Envie-me sua mensagem através do formulário ou entre em contato via telefone para agendar uma visita ao nosso escritório.